Estava assistindo ao programa da Rede Vida que apresentava a missa na Basílica de Nossa Senhora em Aparecida do Norte, no dia 18/10/2014. Missa realizada no Santuário Nacional onde se reuniram importantes sacerdotes.

Entendi porque os evangélicos ganham, a cada dia, mais espaço e adeptos. Uma das missas mais importantes da Igreja Católica, celebrada pela alta hierarquia eclesiástica, mostrou-se cansativa, permeada por músicas chatas e cerimoniais sem emoção.

Acompanhei até o final na esperança de que o conteúdo fosse legitimar a mesmice. Pensei que os sacerdotes, na suas sabedorias, expressariam profundidade nas questões da alma. Ledo engano.

Um padre, provavelmente conceituado no meio – por se tratar de uma missa importante -, interpretou uma das passagens mais ricas e filosóficas da Bíblia, aquela em que Jesus profere a conhecida frase: “...Daí a Cézar o que é de Cézar...”

Esperei por uma análise longa e profunda, entretanto, o padreco se restringiu a um texto decorado.

Parecia um aluno acadêmico apresentando aos seus colegas de faculdade e professores um parco trabalho em que toda pesquisa baseou-se num ponto específico do tema. Não houve abordagens complexas além de uma breve explicação sócio-política histórica. Ainda assim, com preocupação muito mais na forma do que no conteúdo. Se isto é o melhor que a Igreja católica tem para oferecer, realmente precisa urgente de reformulação. Precisa aprender com os pastores evangélicos defender suas teses com desenvoltura de oradores das multidões. Principalmente, com paixão e fé.

A passagem que me refiro é a seguinte:

“Então, retirando-se os fariseus, projetaram entre si comprometê-lo no que falasse. E enviaram-lhe seus discípulos, juntamente com os herodianos, que lhe disseram: Mestre, sabemos que és verdadeiro, e não se te dá de ninguém, porque não levas em conta a pessoa dos homens; dize-nos, pois, qual é o teu parecer: é lícito dar tributo a César ou não? Porém Jesus, conhecendo a sua malícia, disse-lhes: Por que me tentais, hipócritas? Mostrai-me cá a moeda do censo. E eles lhes apresentaram um dinheiro. E Jesus lhes disse: De quem é esta imagem e inscrição? Responderam-lhe eles: De César. Então lhes disse Jesus: Pois daí a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus. E quando ouviram isto, admiraram-se, e deixando-o se retiraram.” (Mateus, XXII: 15-22; Marcos, XII: 13-17).

Inicialmente é importante situarmos historicamente os acontecimentos da época. Jesus representava uma ameaça aos poderes constituídos. Os padrões político-religiosos costumeiros à época sofriam fortes ataques pela pregação subversiva, oposicionista de Jesus. Partidos políticos judeus e romanos dividiam o Poder em uma razoável estabilidade, onde pessoas do alto escalão, de ambos os lados, viviam confortavelmente.

Os fariseus representavam os judeus devotos à Tora. Com suas leis próprias não admitiam a posição de Jesus, que parecia querer destruir ensinamentos tradicionais de maneira a diminuir a influencia que detinham.

 Já os herodianos representavam funcionários do Rei Heródes, isto é, funcionários públicos que serviam ao Governador de Roma, legalmente instituído pelo Imperador César.

Ambos intencionavam manter suas condições favoráveis, desfrutando de situação financeira e bens materiais em abundância, por isso, tentavam desmoralizar Jesus, pessoa que a cada dia ganhava maior liderança.

Pela descrição da passagem percebemos que havia sido realizado um censo, aliás, prática comum no Império Romano que consistia num levantamento – de tempos em tempos – da população para saber quantidade, necessidades e, principalmente, possibilidades da população, de maneira a estabelecer o valor dos impostos.

Pela apuração do censo cogitava-se como certo o aumento dos impostos. Era o momento perfeito para os inimigos de Jesus lhe acusarem de traidor do Império ou aproveitador, dependendo da posição que assumisse em relação ao tema. Foram até ele perguntar. Jesus muito sagaz percebeu a armadilha e respondeu filosoficamente sem se afastar da sua complexa ideologia humanista-espiritual.

Naquele versículo esclareceu pontos fundamentais sobre sua filosofia. Acima de tudo mostrou que sua ideologia e pregação não tinham cunho político, mas espiritual. Clamava pela auto-avaliação humana sobre os verdadeiros e perenes sentimentos, deslocando o foco sobre o material para o espiritual.

 Deixou clara a separação naturalmente necessária entre as coisas do homem, da sociedade, da organização, e, das coisas do espírito, da crença, do sentimento profundo. Em outras palavras, numa vertente não menos importante, a separação entre Estado e Religião. Concluiu que a organização legalmente constituída de uma sociedade é legítima e obrigatória, mas que em nada tem a ver com as ações éticas, morais, espirituais que cada ser humano deve atenção.

A matéria forjada pelas mãos do homem como insígnias são meios viáveis de organização, continuidade, trabalho e convivência que deve ser respeitada. Não obstante, considerar o inexplicável Deus como norteador das nossas atitudes humanas respeitando a moral espiritual incondicional, porque Deus está em tudo e em nada inscrito em forja visível.

Disse que Deus não precisa de dinheiro, quem precisa dele é o homem, e, também assim o homem precisa de Deus, invisível e valioso, tanto quanto o vil metal.

Esclareceu que sua pregação não tinha o objetivo de tomar o Poder Constituído, cujo qual deveria ser mantido pelos líderes dos homens. A intenção era elevar os humanos ao Poder Divino, apaziguando-se em seus sentimentos destrutivos para desfrutarem de emoções perpétuas e sólidas.

Conciliou matéria e espírito, como duas faces do mesmo elemento, tão necessários e óbvios que deveriam caminhar e se equilibrar em consonância.

Julgou não com desdém a administração da política, ao contrario, lhe impôs respeito e subordinação. Em sua enorme sabedoria acrescentou atenção sobre as coisas da alma, como elemento agregado às ações políticas e sociais.

Foi de uma profundidade tal que poderia discorrer páginas na interpretação daquela frase.


Acabo por aqui, certo de que se produzirá por aí.