Considero-me um poeta sem ter
vocação. Considero-me filósofo sem penetrar profundamente na questão.
Considero-me engraçado com as mesmas piadas repetidas de sempre. Considero-me
conhecedor do que gosto pelo simples fato de ter lido alguns artigos do que
gosto. Considero-me intelectual porque penso que sou inteligente. Considero-me
gente porque outros iguais me compartilham afeto e me fazem acreditar que sou
gente. Considero-me profundo porque me apaixono por causas banais. Considero-me
elevado ao defender territórios definidos pela postura social. Considero-me
social por conviver e ser legal. Considero-me pelo que tenho para aparentar meu
poder. Considero-me pelo que julgo ser diferente. Considero-me por destoar
daquilo que os outros creio não possuir. Considero-me pelo que me consideram. Considero-me
pelos amigos que fiz e pelos inimigos que não me condiz. Considero-me pelo que
sei o que ninguém mais sabe, sem saber que todos sabem a mesma coisa que não considerei.
Considero-me ser feliz junto a alguns que considero ser infelizes. Considero-me,
simplesmente. Porque estou vivo e por isso me considero. E devo realmente
considerar. Mas, sem me esquecer de considerar tudo que vive. E tudo que vive
deve ser considerado na medida em que cada partícula se considera. E Tudo se
passa, na esfera do pensar em considerar o que existe.