O COMEÇO DO FIM

 PORTINARI, CANDIDO


Uma notícia ruim nunca vem sozinha, geralmente está acompanhada por inúmeros infortúnios que, exatamente, fazem dela má. Certamente a situação nefasta está repleta de pequenos encadeamentos fáticos, elos imprudentes, negligentes ou imperitos que acabam eclodindo num quadro dramático e inesperado. Desta forma, não podemos atribuir toda culpa há um único elemento. No caso da crise hídrica em São Paulo, por exemplo, não podemos apontar a falta de chuvas como única causadora, tampouco, atribuir ao governo toda responsabilidade. Penso que um conjunto de muitos culpados, durante longo tempo, motivou esta crise, a qual é apenas a ponta do iceberg, pois o muito pior ainda esta por vir se uma atitude realmente eficaz não for tomada.

Começarei apontando os erros que desembocaram na atual situação.

1) Desde a Conferência de Estocolmo, realizada em junho de 1972 e, mais recentemente, a ECO-92, tendo como palco o Rio de Janeiro em 1992 tratavam basicamente do mesmo assunto: medidas para conseguir diminuir a degradação ambiental e garantir a existência de outras gerações. Naquela oportunidade já se demonstrava as importantes alterações climáticas que o planeta estava sofrendo, entretanto, muitos afirmaram tratar-se de um exagero por parte dos chatos ambientalistas. Agora estamos colhendo os frutos, isto é só o começo.

2) Durante anos incutiram em nossas mentes que o Brasil é um pais tropical de riquezas naturais infindáveis. O único país do mundo com abundantes reservas naturais de água, florestas e minerais. O povo brasileiro acreditou e devorou as tais riquezas de forma predatória e sem qualquer responsabilidade, afinal não acaba é ilimitado. Ledo engano. Não só acaba, como não se renovará, pelos menos não em curto prazo, talvez daqui alguns milhares de anos.

3) Corrupção, desvios de verbas e falta de planejamento por parte dos órgãos oficiais para se evitar, de verdade, a poluição dos mananciais e o desmatamento, além, de não investir em saneamento básico para acabar com o despejo de esgoto clandestino nos rios.

4) Falta de responsabilidade política e mediocridade partidária que mentiu para a população na época em que ainda se podiam tomar algumas medidas preventivas apenas para não se tornar impopular e atrapalhar seus objetivos eleitorais.

Estes são apenas alguns exemplos que levaram ao caos que estamos experimentando agora que, certamente, vai piorar se atitudes concretas não forem adotadas. Entre elas posso apontar:

1) Fiscalização rígida por parte dos órgãos públicos com sanções e multas pesadas sobre empresas e indústrias que degradam o meio ambiente, principalmente, aquelas que despejam seus dejetos em área de manancial.

2) investimentos maciços em energias renováveis como eólica e solar, inclusive barateando a tecnologia para uso doméstico.

3) Campanhas de conscientização que não somos o país das reservas naturais ilimitadas e devemos consumir o meio ambiente com responsabilidade, inclusive impondo coercitivamente à população a separação de resíduos sólidos produzidos em cada lar para serem coletados diariamente por unidades públicas específicas.

4) Lei que exija na aprovação de projetos arquitetônicos de qualquer edificação o aproveitamento das águas pluviais e reuso de água através de mecanismos de captação, limpeza e reutilização pela própria unidade geradora. Em outras palavras, estabelecer uma lei onde o engenheiro ou arquiteto tem por obrigação prever no projeto meio de reutilização da água, além de utilizar energia solar onde possível.

5) Cercar com muros altos glebas verdes, de vegetação nativa e fontes de rios consideradas essenciais e transformá-las em reservas ambientais.

6) Parar de engendrar planos eleitoreiros e planejar, através de estudos sérios e precisos, o quanto temos de reservas naturais e quais condições deverão ser exploradas, ainda que a medida dura não satisfaça toda população.

Estas são algumas medidas que por agora me ocorreram, porém, sem sombra de dúvida, se os técnicos se debruçarem sobre este assunto com a urgência e importância que ele merece vão encontrar outras centenas de formas de preservarmos nossa existência.

O planeta não depende de nós, mas nós dependemos do planeta, de maneira que, se o maltratamos Ele nos destruirá e seguirá seu longevo caminho sem a menor preocupação com a falta da presença humana.


Enquanto não entendermos o que está em jogo não é a vida do planeta, mas a nossa própria continuaremos, como crianças mimadas, agir com desnecessários excessos, até ao ponto do Planeta nos extinguir e seguir sozinho.