ANIMAIS

                                                                                          HENRI ROUSSEAU


Conta uma antiga fábula os causos e coisas que se sucederam numa densa floresta tropical do Hemisfério Sul do Continente Americano.

Os animais que lá habitavam viviam harmoniosamente, em plena paz e sossego, desfrutando na medida certa dos abundantes recursos naturais que lhe cercavam, até a chegada do Cavalo.

Entre todos os animais daquela floresta nunca se havia vislumbrado magnífica espécie. Chegou petulante, trotando formoso por entre a bicharada que cochichava entre ouvidos, arrancando suspiros de alguns admirados.

Desfilou imponente por toda floresta e, em pouco tempo, dominou a situação. Na verdade modificou tudo que até então existia. Antes não havia mais que ninguém, todos viviam iguais apesar de tanta diferença, tratavam da vida naturalmente, apesar de algumas vezes, é certo, ser a vida nada condescendente com a morte, entretanto, essa harmonia dos alimentados e alimentantes imprimia sentido natural aos dias que se sucediam tranquilamente.

O Cavalo chegou e foi logo impondo seu reinado. Usou de muitos coices e bravios relinchares - cujo vigor físico lhe propiciava - para meter medo e autoridade na bicharada da floresta. Logo conquistou súditos temerosos coroando-se como Rei.

Não demorou muito para os ligeiros macacos o adularem em troca de proteção e farta comida. Mas, sempre na hora marcada algum macaco tinha que entregar um bicho de oferta. Talvez um animal que pastava longe das cercanias, ou àquele que preferia musgo à carne, ou, simplesmente, porque o macaco sacana dedurava até quem nada tinha só pra bajular.

Logo se amontoaram ao lado do Cavalo as hienas. Riam de tudo e por tudo. O Cavalo adorava! Dava coice na cara de um, relinchava do jeito do outro, cuspia no bigode daqueleoutro: as hienas riam de chorar...Viviam do que o Cavalo oferecia quando empurrava algumas sobras da sua refeição.

Aproximaram-se, então, as taciturnas corujas, que por lá detinham muito respeito. Juntaram-se a elas as raposas. Durante a noite, sob céu estrelado e lua brilhante reuniam-se todos em circulo. As corujas observavam. As raposas rodeavam o Cavalo em frenética conversação lhe pondo em estado de puro êxtase. Bebiam das melhores águas, comiam das especiais iguarias que incessantemente lhe traziam as formigas para aquele jantar de negócios importantes. As formigas carregavam enormes quantidades sem esgotamento. Vindo, indo sem parar. Trazendo, levando a comida.

Eram sempre elas, coitadas das formigas! Trabalhavam dia e noite, descansando poucas horas na sua humilde colônia. Mas, não se importavam porque também se divertiam. Tinham senso de obrigação. Era isso.

As raposas convenceram o Cavalo que ele precisava negociar com os ratos para trabalhar com ele. Rapidamente os ratos se associaram, com uma única condição: Deixe-nos em paz, vivendo da nossa maneira e iremos trazer tudo que quiser. Assim foi acordado e feito.

O Cavalo estava no paraíso. Rei de tudo, cercado por adorados e adoradores. Mas o habitat havia se transformado, e pra pior. A bicharada não se comunicava como antes. A morte era aviltante e a vida sombreada por escassez. O contrário se tornou igual; o errado normal. Desequilíbrio surgiu naturalmente.

Mas, tinha as corujas. Elas acharam aquilo tudo muito diferente. Voaram até outro Continente para se aconselharem com os rinocerontes. Estes logo se aperceberam do mal que havia se instalado. Correram todos: corujas e rinocerontes até a floresta. Desmascararam o Cavalo, pois não era cavalo era burro. Um burro se passou por cavalo. Enganou a todos. Ainda bem que solucionaram o problema.


Acontece que lá onde vivem os rinocerontes também existem girafas sem pescoço.