NATUREZA CAPRICHOSA

                                                                                                    TOMIE OHTAKE




O caipira é mesmo um povo divertido e sabido.

Recentemente estive nos rincões sertanejos deste nosso imenso e diverso Brasil onde tive a oportunidade de sentar-me ao pé de um frondoso Jatobá para sob sua refrescante sombra degustar um geladíssimo caldo-de-cana. De todo este prazer o maior foi conversar com o caipira ao meu lado.

Após uma longa viagem era reconfortante respirar profundamente aquela brisa do interior enquanto meus dois filhos que regulam em idade - apenas dois anos de diferença - brincavam sobre o chão de terra batida onde cada pedra ou inseto era uma novidade a ser explorada.

Bem próximo, na minha diagonal, sentado sobre um toco de árvore que servia de banco um caipira descascava sua laranja com paciência e tranquilidade impossível de se observar no homem da cidade.

 
Ele, percebendo que eu o fitava, disse: Isso aqui é bão - referindo-se à laranja - refresca a garganta iguar esse teu aí - indicando o copo de caldo-de-cana.

Trocamos algumas palavras e sem tardar logo estávamos conversando. Certo momento, observando uma pequena divergência ocorrida entre meus filhos, comentei: Nem parecem irmãos, o que um pensa o outro não pensa; o que um quer o outro não quer...

O caipira logo emendou: IH...é assim mesmo seu moço. Numa fazenda onde trabalhei, dum homem de respeito, usineiro importante. Prantava cana e produzia álccol e cachaça...
 
Imediatamente percebi que se tratava de um destes causos agradáveis de se ouvir contado pelo povo simples do interior. A estória era a seguinte...

Um fazendeiro muito rico. Homem austero, com costumes tradicionais queria ter descendentes. Por um capricho da natureza sua esposa não engravidava. Com abundância de recursos e firmes no desejo contrataram o melhor Geneticista que havia na região.

O médico então, submeteu o casal ao procedimento de inseminação artificial homóloga, cujos gametas utilizados eram deles próprios.

Resultado - a mulher concebeu gêmeos univitelinos, issto é, dois meninos idênticos desenvolvidos a partir de um mesmo óvulo.

O pai felicíssimo da vida tratou de cuidar dos dois filhos à mesma maneira. Quando um ganhava um brinquedo o outro ganhava igual; vestia os dois com roupas iguais; dosava amor e carinho com a preocupação de ser na mesma medida; empenhou-se em conceder educação e diciplina rigorosamente igualitária; Tratava os filhos sem distinção e se orgulhava disto. Costumava repetir que por falta de um, agora tinha dois filhos que cuidariam dos seus negócios, trabalhando como relógios perfeitos na consecução próspera da coisa.
 
Mais si vê seu moço...um parzinho iguarzinho de muda de pranta cresci diferente...modo de quê dois individu ia ser iguar?! - asseverou o caipira.

Os meninos cresceram e o pai já tinha o plano traçado para a vida deles. Um cursaria a faculdade de administração, para gerir os recursos materias da fazenda e o outro faculdade de agronomia para gerir os recursos naturais.

Uma vez elaborado o perfeito projeto, o pai dedicou todos seus esforços para executar de bom modo. Os meninos, em data de cursar nível superior, matricularam-se nas respectivas Universidades.

Lá pelo segundo ano tudo mudou.

O menino que cursava Administração desistiu, queria fazer faculdade de Moda. O pai apesar de controlador já não deliberava sobre a vontade do filho, por mais que fizesse o menino queria diferente. Não teve jeito, foi cursar Moda.

Entristeceu-se o velho pai que passou a depositar toda sua esperança naquele que estudava Agronomia. Estava indo bem...Finais-de-semana jogava bola num pequeno time da cidade e o resto da semana estudava...Isto pensava o pai...porque não era bem assim.

Demorou a descobrir que o filho pouco frequentava a Faculdade e havia reprovado várias matérias. Passava o dia namorando e jogando futebol no time em que até era artilheiro.
 
Pobre pai... fez de tudo pros fio cuida dos negócio, mas...

...Pode até paga pra nasce, mais dinheiro nenhum compra as vida. Um só queria sabê de chuta bola e o otro de faze carinho na bola. - destacou o caipira.
 

O pai que antes era só alegria desmoronou-se em amargura. Se transformou num homem sisudo e de poucos amigos.


Mais num é de sê nada não, porque um menino foi contratado pra joga lá na China, ganha um dinheirão. O otro faz aquelas roupa istranha pro povo da França, mora lá, do lado daquela torre famosa...

...O único que sofre mesmo é o pai desgostoso, que não percebe a felicidade dos fio. - completou e finalizou o caipira.