GRANDE ARQUITETO DO UNIVERSO III

TOMIE OHTAKE
TOMIE OHTAKE
                                                                             




O TERCEIRO DIA – LUZ E ESCURIDÃO



A substância sentia os corpos em sua plenitude. Eram infinitos corpos de infinitas formas. Corpos imensos, grandes, pequenos, minúsculos, densos, maciços, leves, porosos, visíveis, invisíveis, sólidos, líquidos, gasosos, ondulatórios.

Todos os corpos manifestavam-se diferentemente na substancia, eram infinitas formas aparentemente individuais e destoantes, entretanto, na verdade, era forma única da substância onipresente em si.

Todos os corpos exalavam afecções, aparentemente confusas e destoantes, entretanto, na verdade, era a única afecção da substancia pela sua absoluta onisciência em si.

Todos os corpos criavam e se destruíam mutuamente num incessante embate de força, corpos sobressaiam sobre outros, subjugavam seus pares, dominavam ou eram dominados dependendo do poder que cada qual orquestrava, entretanto, na verdade, era a única força ou poder da substancia pela integral onipotência em si.

A substancia, então, percebeu que suas partes eram ignorantes, não tinham ciência de si. Agiam todas com tal individualismo que pensavam não pertencer a si. Desta sensação compreenderam-se, as partes, finitas, de modo que sentiram a transitoriedade das coisas, tornando-se mortais, com ideia de início, meio e fim.

Diante disto acharam-se sozinhas donde recaiu o temor de não mais compor o que antes era uno. Criou-se o medo e com ele surgiu o escuro breu das trevas.

A substancia sentiu seus mais profundos anseios e medos e deste juízo destacou suas partes aflitas aos cuidados de Érebo: força reminiscente do vazio, assim se fez a escuridão.

A substancia experimentou seus maiores pesadelos que se rebelavam autênticos, a eles deixou aos cuidados de Tártaro, nas profundezas abissais, assim se fez as trevas.

A substancia conheceu os medos latentes, mas pacíficos e a estes reservou Nix, assim se fez a noite.

Mas, a substancia também se sentiu tenra, de uma brandura eterna das suas partes etéreas harmonizou-se sobre Hemera, assim se fez o dia.


A substancia se regozijou com tudo que lhe impressionava e fez da luz e ausência dela um ciclo interminável.