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DAVID UZOCHUKWU |
AH!....que coisa completamente tosca...detesto
quando isto me acontece...mas, vá lá, é simplesmente inevitável.
Não. Não é estar aqui neste decadente
recinto introjetado numa penumbra baixo-astral, cercado de pinguços
depressivos. Nem é esse balcão sujo de madeira carcomida que tem um cara do
outro lado que até é amigável, me serve a medida caprichada da sua melhor
batidinha de coco...ah...como é bom essa batida...parece suave mas deixa muito
louco, é puro álcool, demais saborosa.
Fico olhando o cara e analisando
mentalmente: que porra de solidão esse cara é ?!
Levo tudo neste pé, para mim esta é a
caminhada. Mania imbecil que tenho em sintetizar, mas acho que se resume todo
este monte de carne e toda bosta possível animada por um espírito que chamamos
“ser humano” a coisa da solidão. Sentimento ducaralho.
Fico olhando cada indivíduo: sentado,
em pé, escorado, rindo, conversando. Nesse lugar de pessoas reunidas em
completa solidão. Meu olhar gira alucinado por explicação. Vejo em cada
atitude: andando; mexendo; rosto se
expressando; mãos entrelaçadas na cabeça; coçando orelha; apalpando o pau;
cutucando a bunda; animado; desgraçado...
Vejo em cada um deles uma incessante
vertente da solidão.
Vejo em mim mesmo essa porra de
observação. Então me pergunto, por quê?
Entorno uma golada generosa antes de
responder a mim mesmo.
Tememos ser esquecidos. Todo mundo
quer ser lembrado, reconhecido – respondo mentalmente.
Não precisa ser prestigiado, não é
isso. Basta ser rememorado numa conversa qualquer, basta adquirir existência
além do que se julga existir. Tem que ir além, muito além da solidão que
intimamente nos acompanha a cada segundo. Isto só é possível pelo outro. Ele é
quem lembra de nós. Por isso tentamos, com a força dos dentes da boca e da
alma, fazer ou dizer alguma coisa que faça sentido.
Por isso podemos ser qualquer coisa,
desde que esta coisa seja marcante.
Tem o idiota, palhaço, esperto,
inteligente, honesto, malandro, comedor, fudedor, a puta, o zueiro, briguento,
matador, traficante, o burguês, milhionário, filhinho de papai, político, o
homem-bomba, o cientista, o político, o idealizador, as porras de milhares de
coisas que uma pessoa pode atuar em ser ou adaptar seu personagem em viver...Tudo
para tentar forjar sua marca. Não ser esquecido jamais...
Esse bando de pinguço que cambaleia
por esta pocilga buscando uma trivial conversa, empolgando-se em contar as
proezas vividas como odisseia épica são iguais às pessoas de boa conduta que
cambaleiam atrás de um fio condutor seguro que possa trazer alguma certeza que
fizeram a coisa certa para jamais serem esquecidas.
É Face, tuwiter, whatsapp, page,
blog, vídeo, concurso, quinze minutos de fama. Pode ser uma tese, um parecer,
uma descoberta científica, como pode ser nada, porra nenhuma.
Todo mundo é livre para quando e como
quiser se manifestar desde que um idiota qualquer não esbofeteie sua cara.
Estes miseráveis excluídos neste
boteco onde o banheiro fede a mijo podre, não é nada diferente do certinho
engravatado enforcado no redondo círculo quadrado das linhas que se fecham
formando um quadrilátero da ação, empáfia, aprovação e lembrança.
Por isso tão temida a doença do
Alzaimer. O ser humano chegar a condição absurdamente inexplicável de esquecer-se
de si mesmo. Ostracismo de si mesmo.
Que merda!
Já não vejo coisa alguma, minha visão
está turva. Vou-me embora.
Vou caminhar sozinho nesta porra
deserta de rua numa cidade adormecida até encontrar meu lar, onde lá certamente
não esqueceram de mim: minha mulher vai gritar na minha orelha, meus filhos
lançarão olhares de reprovação e eu bêbado feito um gambá vou largar meu corpo
embriagado em qualquer lugar para descansar. Para mais tarde eles carregarem
todo este corpo estorvante para a cama de ninar onde terei bons sonhos.