OLIVER DE SAGAZAN
Pouco mais de um mês se
passou e as causas da mortandade ainda era um mistério. A cadeia pública foi
desativada, os únicos habitantes daquele sombrio lugar eram as baratas. Uma
empresa de dedetização foi contratada, mas estavam com dificuldade de controlar
a infestação. Duas vezes por semana despejavam veneno e retiravam baldes de
insetos mortos, porém nova remessa surgia de todos os cantos para novamente
infestar o lugar. A empresa relatou nunca ter se deparado com tal situação. O
controle da praga de baratas apenas se resolveu depois de centenas de litros de
veneno derramados pelo local e tubulações anexas. A delegacia ficou fechada por
várias semanas para evitar intoxicação dos funcionários diante do forte cheiro
de inseticida.
Ao final de dois meses o
laudo pericial concluiu que as mortes ocorreram por falência múltipla dos órgãos
em consequência de bactéria inominada. A conclusão do laudo se deu,
principalmente, por causa do único sobrevivente, pseudônimo Negão. Ele
continuava preso no Manicômio Judiciário Central, um lugar que reunia loucos de toda espécie e grau.
Sentenciados, que guardavam o mínimo de lucidez, preferiam cumprir pena na pior
das penitenciárias ao invés de serem jogados no MJC, quão detestável era aquele
lugar.
Negão ficava isolado
numa cela de 3x3 m², inteiramente acolchoada, trancada por uma pesada porta de
aço com um orifício para comida e um pequeno retângulo de vidro que fazia a
única ligação do ambiente interno para o externo e vice-versa. Uma vez por dia,
sob o efeito de fortíssimos calmantes, o detento era levado para tomar banho de
sol, fazer suas necessidades e tomar banho num cano de água fria.
Ele passava o dia
inteiro dopado por medicamentos, mesmo assim, ao escurecer da tarde, ao
aproximar-se a noite, Negão começava a ficar agitado, nitidamente desesperado,
dizia que o “coisa ruim” vinha lhe
visitar todas as madrugadas. Sofria de insônia e berrava muito, então era
necessário dobrar a dose de calmante, as vezes não fazia efeito. Ele havia
contraído uma bactéria desconhecida que começou a atuar nos dedos do pé
esquerdo, necrosando-os. Os dedos tiveram que ser amputados. Em pouco tempo o
pé necrosou, a tíbia...
As elevadas doses de
antibióticos não eram capazes de controlar a bactéria que se multiplicava no
seu sangue. Os médicos classificaram como superbactéria desconhecida. Negão perdeu
metade da perna esquerda e os médicos sabiam que logo deveriam amputar outras
partes do seu corpo.
Do outro lado da cidade,
em uma das mais densas favelas da Zona Leste...
Muleke
como era conhecido o mais jovem traficante, mantinha três pontos de tráfico de
entorpecentes em becos decadentes daquela imensa favela. Mandava com punhos de
ferro, tinha o respeito dos infratores locais, pois estava envolvido com uma
poderosa facção criminosa.
Seus pais haviam se
convertido ao evangelho. O pai e a mãe não tinham mais que quarenta anos.
Tiveram filho quando adolescentes, justamente o Muleke, que desde muito cedo se
envolveu com os criminosos da redondeza. Diante disto, se tornaram evangélicos
na esperança de alterar o futuro negro do filho, mas em vão.
Muleke morava por conta
própria em um sobrado luxuoso para o padrão local. Certa noite, como de
costume, estava em seu ofurô acompanhado por três mulheres. Se divertiam ao
sabor de muito uísque e cocaína. Levantou-se e foi até a cozinha buscar mais
gelo. A cozinha ficava no andar de baixo. Desceu as escadas e não se preocupou
em acender as luzes, conhecia muito bem sua casa, além do mais, estava uma
noite esplendorosa onde a luminosidade da lua entrava pelas janelas abertas e
clareava a contento o cômodo. Retirou algumas
formas do congelador e passou a despejar num recipiente térmico. De repente
ouve um estampido de estouro: era a luz da geladeira que acabará de queimar.
- Merda! Também quem
manda deixar a porta aberta – recrimina a si mesmo, fechando com violência a
porta da geladeira.
Um forte barulho – como
algo pesado despencando no chão – se ouve logo adiante, na área de serviço.
Muleke se assusta, mas
destemido como sempre se encaminha em direção do barulho, resmungando:
- Que será desta vez
PORRA?!
Vistoria a área de
serviço e não encontra nada de diferente. Tenta acender a luz, mas está
queimada.
- Que merda! Vou pegar o
gelo.
Então, num gesto de
ignorar se volta para trás e se depara nitidamente com um vulto disforme na
penumbra da luz da lua. Retrocede dois passos e o vulto impele em sua direção.
Antes que pudesse ter qualquer reação o vulto toma conta do seu corpo.
Transtornado pega uma faca de açougueiro na gaveta e um amolador de facas. Com
delicadeza e esmero afia a faca com movimentos uniformes e precisos. Após
trinta minutos retorna com o balde de gelo em uma das mãos e na outra, pendida
para baixo, a faca.
- Que demora Mulleke!
- Deixa suas meninas sozinhas
e carentes. Vem logo pra dentro.
Sem dizer palavra coloca
o balde de gelo na mesa ao lado da garrafa de uísque e adentra o ofurô com a
faca na mão.
- Para que esta faca? O
que vai aprontar Muleke?
Antes que pudesse continuar
outra frase a menina é cravada no coração pela lamina afiada. As outras duas
ficam perplexas e paralisadas. Antes que uma delas, ao seu lado, pudesse se
mexer é perfurada com duas rápidas e precisas facadas entre seus fartos seios.
A água do ofurô
avermelhou-se com o sangue. A terceira e última menina grita desesperadamente e
tenta sair, porém antes que conseguisse escapar é puxada pelas pernas e empurrada
para baixo. Ele segura sua cabeça por alguns instantes, apesar dela se debater
para se desvencilhar sua força é inócua diante dos fortes braços do Muleke. Ele
a retira da água segurando-a em uma gravata. Asfixiada, tenta respirar, quando
aspira um acalentador bocado de oxigênio, a lamina da faca desliza
profundamente sobre seu pescoço. Seu corpo sem vida afunda, desaparecendo na
vermelhidão da água. Ele sai do ofurô, se enxuga em uma toalha branca que fica
manchada pelo sangue do seu corpo.
Caminha calmamente até a
sala do andar de baixo, pega dentro do armário uma submetralhadora Taurus
SMT-40. Com rosto impassível e andar fortemente cadenciado vai até a garagem, entra
no seu Golf GTI 2.0 TSI e parti rumo a casa dos seus pais a menos de dois
quilômetros entre vielas e ruas estreitas.
Estaciona o carro em
frente ao casebre dos pais localizado numa bifurcação perigosamente encostada
no morro. Entra silenciosamente na casa, já que tinha a chave. Segurando
firmemente a faca de açougueiro caminha diretamente ao quarto. O pai somente de
cueca dormia de bruços, a mãe apenas vestindo uma calcinha estava deitada de
frente.
Perfura o pai três vezes
pelas costas, na altura dos pulmões, próximo ao coração, tão rápido e letal que
a vítima apenas murmura um grunhido agonizante. Arremessa o corpo do pai ao
chão, cujo estrondo acorda a mãe de seu profundo sono. Ela abre os olhos e o
Muleke está ajoelhado sobre sua anca.
- É você filho?!
Tomado pelo mal encosta
suas mãos nos lábios dela, silenciando-a.
- O que você quer?! – Pergunta
baixinho
Ele acaricia os seios da
mulher e com seu genital ereto esfrega sobre a calcinha da mãe. O quarto é
tomado por uma névoa negra, envolvendo os dois corpos que passam a praticar o
coito ardente. A mãe segura com desejo o quadril do filho que a penetra com
força. Fazem sexo por longos trinta minutos. Após ejacular dentro da vagina da mãe,
se levanta, veste a sunga e desaparece tão repentinamente quanto chegara.
Novamente em seu carro
inicia seu percurso, que poderia ser considerado a via-crúcis da morte. Passa por seus três pontos de venda de droga, denominados,
cada qual como: “loja”. Desce do automóvel, entra no beco, seus “funcionários”
se admiram: Olá patrão, que tá fazendo por aqui? Antes que pudessem começar
outra frase, são todos alvejados pela rajada da submetralhadora que trazia
consigo. Fez repetidamente a mesma ação nas outras duas “biqueiras”.
Após não deixar
sobrevivente para contar estória subiu ao ponto mais elevado do morro, um
descampado conhecido como “crematório”. Em meio a um amontoado de tijolos e
lonas velhas pegou um galão de gasolina que sabia estar ali reservado. Despejou
sobre o próprio corpo e ateou fogo, ardendo até a morte.
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