CAMINHADA

ANTÔNIO DIAS


Vivo em Marte, com a cabeça nas estrelas,
Pensando em você, e como tudo
Poderia ser diferente, e mais
De nós, de você, de mim.

Vivo afundando no mar
Como mergulhador de snorkel
Sem habilidade para profundezas
Me falta ar, me afogo com frequência.

Vivo nas nuvens, flácidas e permeáveis
Pisando em terreno inconsistente
Como se fosse sólido.

Vivo as meias verdades de todos os dias
Os disfarces, as corruptelas,
O sorrisinho jocoso
O aperto de mão duvidoso.

Por outro lado, vivo tão bem
Vivo uma observação
De uma amizade gostosa.

Vivo a reação verdadeira
De quem se gosta.

Vivo o amor indecifrável,
O por quê de continuar,
Ainda que nada se explique
Tudo se revela imensuravelmente.

Porque deixar-se fluir,
Não é falso, nem real,
É o gosto espectral em existir,
A façanha absoluta
Do conviver e convir.