O DIA EM QUE O FUTURO PASSOU

ARSHILE GORKY

É comum comparar o passado com o presente, principalmente quando excitado por um saudosismo irracional se tenta dizer que a vida do passado era muito mais feliz que a vida do presente.

Alguns fazem esse inútil exercício tomados subitamente por um apavoramento ou perplexidade diante das coisas rotineiras do presente.

Geralmente movido pela vivacidade de um segundo de momento divergente da pseudoestabilidade dos anos, a pessoa compara os dias atuais com dias antigos, exaltando o passado e execrando o presente.

Obviamente que após uma análise racional e minuciosa não há de se concordar que o passado é melhor que o presente, desde que considerado na avaliação todas as comodidades, facilidades, poderes, eficiências, longevidades, curas, aprimoramentos, que as coisas de hoje agregam ao que já não mais existe.

Na verdade são as mesmas coisas de forma abruptamente amadurecidas, de maneira que o espanto cria a velha noção da antipatia.

Digo que são velhas formas humanas compreendidas por óticas velozes do conhecimento travestindo-se de cisão absoluta, quando na verdade são desdobramentos naturais da concepção anteriormente construída que agora atinge a feição lapidada, afastando-se das inutilidades descartáveis de uma visão viciada e baseada no sentimentalismo repressor e reprimido.

O que nos torna absolutamente superiores das outras espécies é exatamente a capacidade de pensar, continuar pensando, construir e reconstruir novos conhecimentos.

Impossível dizer que o mundo atual é pior que a época em que se enforcava seres humanos em praça pública; legalmente poderia escravizar o semelhante; estuprar mulheres como troféu de guerra; invadir casas e exterminar toda a família; morrer milhões pela peste negra; beber agua contaminada; morrer apedrejado por ir na casa do vizinho; crer que a terra é o centro do universo; que na borda do mar há um precipício; caminhar uma semana para se deslocar cem quilômetros; ver os filhos mortos pela seca; ter a vida decidida pelo capricho do imperador; expectativa de vida em torno dos trinta anos; etc...

Embora tudo isto continue da mesma forma, de outro jeito, há agora, uma ideia possível em se desenvolver e aparecer.

Simplesmente é um absurdo acreditar que somos menos felizes hoje do que infelizmente fomos no passado. Jamais o ser humano será feliz, mas, certamente, hoje a possibilidade é maior.

Acontece que com a infinita oferta de felicidade a demanda fica cada vez maior, crescendo proporcionalmente.

O problema não reside em alcançar a felicidade, mas o quanto queremos consumi-la.

Quanto maior a quantidade prospectiva de felicidade, maior a perspectiva de infelicidade.

O fato é que o futuro nos reserva algo tão sedutor que precisamos dele neste momento, fato que somente poderá ser alcançado se tiver a capacidade de reunir todas as tecnologias mediatas e imediatas, agora.

Atualmente o Brasil elegeu um Presidente retrogrado, reacionário, porque a população conservadora perdida em meio a realidade corruptível da alma humana fantasiou que a incompetência e inaptidão poderia superar a infâmia.

Aguardo ansioso os próximos capítulos desta novela...