O DESPERTAR

 

ED RUSCHA


Não tenho Mestre, tampouco Guru,

Não sou Sábio, Santo ou Profeta,

Na verdade, nem quero nada disso,

Nada procuro além daquilo que possa permanecer inalterado e inabalado dentro do coração,

Assim, sem grandes estudos ou profundas meditações, às vezes e de repente, tenho uma experiência direta. Funciona muito bem quando estou cercado por pessoas.

Em momentos não buscados, quando em meio há muitas pessoas, de olhos bem abertos, começo perceber a atuação em cada um. Parecem todos um personagem, cada qual desempenhando seu papel, cujo roteiro e script se torna claro e previsível diante de minha observação. Os sons antes divisíveis e identificados, passam a se misturar e formar um ruído em uníssono. Todos se movimentam ao redor como num tablado, em sincronias calculadas, cujos lábios, expressões e comportamentos são esperados, propositados, prováveis como num enredo que se tem antecipadamente a ciência. Parece uma novela da qual me recordo ter assistido. Todos aqueles que até então eram distintos começam ficar cada vez mais parecidos, como se fossem atores muito bem escolhidos para interpretar. Olho a mim mesmo e vejo mais um personagem junto àqueles que por mais fisionomicamente diferentes, parecem profundamente iguais. Toda aquela gama de imagens, luzes, ruídos, movimentos, se agitam e se misturam em um silencio único. Nesta hora sou tomado de uma ausência, tão grande ausência que nada mais faz sentido, coisa alguma fica, de maneira que não há problema ou solução presente. Dentro desse vazio contagiante surge um contentamento e felicidade indescritível, como se o mundo em suspensão flutuasse no vácuo. Da mesma forma inopinada que chega, se vai. Os olhos continuam abertos, mas a realidade retorna tão rápida que parece não ter saído. As coisas voltam ao seu estado original e comum. Resta apenas uma lembrança como num sonho que parece ter durado horas, quando na realidade, percebo um lapso de alguns segundos. A vida volta ao seu estado diuturnamente sólido. Interajo como se nada tivesse se passado e testemunho que para todos ao meu redor nada aconteceu. O rumo da conversa segue seu caminho, as mesmas brincadeiras, as mesmas risadas, as mesmas conversas e reclamações, enfim, tudo volta ao normal. Sigo em frente como todo dia, com uma única diferença: lá no fundo sinto que não posso levar tudo isso muito a sério.